quarta-feira, março 10, 2010

Parte.

Aos cães, quando fazem quimioterapia, não lhes cai o pêlo.
Mas também morrem, sem música e sem faculdade, e sem fecharem os olhos.
Confiam-se aos donos até ao último segundo. Mesmo sabendo, porque eles sabem, mesmo adivinhando, porque eles adivinham, mesmo conhecendo, porque eles conhecem. O dono é sempre o dono, e ele faz tudo por que o cão viva enquanto a vida for vivida. Então, o cão não teme. Pode temer trovoada, guarda-chuvas, harmónicas, cães mais (ou menos) assustadores. Teme que lhe roubem os filhotes, que lhe roubem o dono. Mas do dono não duvida.
Adoecem, mas continuam a proteger a casa com unhas e dentes (sobretudo dentes...). Enfraquecem, mas nunca desistem de tentar guardar as lágrimas entre duas lambidelas. Envelhecem, mas não se esquecem de quem é o dono, qual é a casa, quem é que lá vive, e quando é que ela acaba.
São parte. Quando chegamos, são a primeira parte da casa que chega, e são quem sabe que chegámos ainda antes de termos chamado o elevador. O cão é o pai que recebe o filho pródigo de braços abertos, ou aos saltos, de rabo a abanar com tanta violência que as patas escorregam no chão, língua de fora, a puxar as mangas da camisola. O cão sabe, quando é amado. Percebe e conhece e fala.
E depois morre, sem música nem faculdade, deixando-se cair nos braços de quem o criou.

sábado, março 06, 2010

Mwanito, não me deixe sozinho.

Dói? Sim, sozinhos, dói.
Muito? Pois.
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Mwana era o afinador de silêncios pessoal de Silvestre Vitalício, seu pai. No silêncio, tudo deixa de doer. Foi o mistério que o irmão Roger soube desvendar ao mundo.