Aos cães, quando fazem quimioterapia, não lhes cai o pêlo.
Mas também morrem, sem música e sem faculdade, e sem fecharem os olhos.
Confiam-se aos donos até ao último segundo. Mesmo sabendo, porque eles sabem, mesmo adivinhando, porque eles adivinham, mesmo conhecendo, porque eles conhecem. O dono é sempre o dono, e ele faz tudo por que o cão viva enquanto a vida for vivida. Então, o cão não teme. Pode temer trovoada, guarda-chuvas, harmónicas, cães mais (ou menos) assustadores. Teme que lhe roubem os filhotes, que lhe roubem o dono. Mas do dono não duvida.
Adoecem, mas continuam a proteger a casa com unhas e dentes (sobretudo dentes...). Enfraquecem, mas nunca desistem de tentar guardar as lágrimas entre duas lambidelas. Envelhecem, mas não se esquecem de quem é o dono, qual é a casa, quem é que lá vive, e quando é que ela acaba.
São parte. Quando chegamos, são a primeira parte da casa que chega, e são quem sabe que chegámos ainda antes de termos chamado o elevador. O cão é o pai que recebe o filho pródigo de braços abertos, ou aos saltos, de rabo a abanar com tanta violência que as patas escorregam no chão, língua de fora, a puxar as mangas da camisola. O cão sabe, quando é amado. Percebe e conhece e fala.
E depois morre, sem música nem faculdade, deixando-se cair nos braços de quem o criou.
5 comentários:
Soubessemos nós confiar e amar da mesma maneira.
Confiarmo-nos no colo de Deus sabendo que, seja o que for que vier, será porque é o melhor. Porque é aquilo que, naquele momento, é melhor para nós e para os outros.
Porque faz parte do plano de Deus para nós.
Ela tinha aquele mau-feitio proverbial.
Mas era uma mestra em teologia...
Não sei como me habituarei à ausência.
A esse vazio que é ela não saltar e não ladrar e não rosnar quando chego, quando alguém chega, quando o elevador arranca.
O não ter de esticar o dedo quando os filhos entram em casa.
O não ter de pôr duas gamelas porque senão o Panic não come nada.
Esse ter a certeza de que se é imprescindível, de que se é o sol na terra para... ela. Ia dizer «alguém». Tonterias...
O vazio é ENORME e depois, a pouco e pouco, vai ficando mais pequenino... Força minhas lindas!...
olha, se ela nunca te abandonou, não te abandonará a memória :)
beijinho, Anita.
Lá vai o tempo em que se ouvia nessa casa "Entra um cão e eu saio!"
Entrou!
... e faz parte da história...
Por isso fica!
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