É incrível. Era preciso estarem lá, para que vos explicasse.
Há sempre uma parte do texto que ainda não tínhamos ouvido. Pelo menos, não assim. Há sempre algures no texto qualquer coisa especialmente para nós. Há sempre um pormenor, uma palavra, uma expressão facial que nos toca, ou nos faz rir, como ainda não tinha feito nos espectáculos ou ensaios anteriores. É incrível como nós, ouvindo tudo pela 600ª vez, voltamos a sorrir, voltamos a gritar ou a chorar. Voltamos a vir cansados, despenteados pelo mundo lá fora, hoje mais vulneráveis ou mais irritados, e ainda assim tudo se repete: as falas e o choque, as gargalhadas e as palmas, bem como tudo o que temos de fazer para que a mensagem passe: quer estejamos bem ou mal, aflitinhos ou com sono. Tudo para que Alguém nasça algures no público, de todas as vezes.
Incrível como nós, todos tão diferentes, ficamos todos imóveis, espectantes, atrás dos panos, na mesma parte do teatro que já todos sabemos de cor, como se tambem nós o fizéssemos, como se colectivamente nos apaixonasse aquele gesto pela primeira vez. E as pessoas vêem. Vêm, aplaudem, vão embora. Às vezes voltam no dia seguinte. Vêem três homens milimetricamente ajoelhados num chão de azulejos, umas roupas estranhas, dois anjos, um cenário. Não vêm a multidão escondida, sentada e sobretudo de pé, desorganizada e espectante.
Não vêem o senhor que a todos cativou. Aquele senhor pequenino, já velhinho, com uma pronúncia estranha, que a todos conhece sem que ninguém saiba - porque não é preciso saber. Aquele senhor que guarda e cuida um génio, condignamente, humildemente. Aquele senhor que sonhou e montou e passou. Que não chegou atrasado, nem parte cedo de mais. Aquele senhor que também foi São José, que também foi Anjo, que tambem foi Casimiro, que também foi Caifás e Pedro e Judas, e o cego de nascença. Que observa, que ama assim como ele sabe. Que, a cada vez que o procurámos, nos ensinou a cultura, a alegria, o temor, mas sobretudo, a simplicidade de Deus.
Anjos e Magos ainda em cena, 18 e 19 de Dezembro, nas Patameiras.
3 comentários:
Elogio em vão, mas aqui vai:
Estiveram todos espectaculares. O teatro já de si é muito bom mas voçês encararam-no com muita dedicação. Fizeram um trabalho esplêndido. Obrigada por uma noite tão agradável.
ola ana
Eu gostei.
Estive antes, estive durante, estive depois. Deste lado, o lado que não dá vivendo, mas que recebe vivendo.
Gostei de o ver, sorridentíssimo, felicíssimo, contentíssimo...
Carregou comigo numa dessas noites pesos que já me começam a cansar a vontade. Isto para que não carregasse sozinha (e também para acalmar-lhe os nervos...).
E no fim veio ter comigo, sorridente, apertou-me a mão... Acho que não sabe nem nunca soube o meu nome. Mas conhece a minha cara. E agradece. E sorri...
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