Penso que podemos falar em dependência.
Ela sofria verdadeiramente enquanto ele não chegava a casa e se deitava a seu lado. Ela precisava de o proteger para estar protegida. E este voltar a casa é claramente figurado. Para ela, estar em casa era estar bem, era entrar no habitat, aquele lugar onde se é feliz e todas as verdadeiras necessidades são satisfeitas. E o "ele não chegar a casa" era ele não dizer nada ao voltar do treino, não tocar à porta ou mandar uma mensagem. Ela precisou, durante muito tempo, que ele entrasse quase totalmente na sua rotina. Assim, era-lhe, a ela, fundamental saber onde ele se encontrava ou saber o porquê de ele não dizer onde estava. Ela dava-lhe liberdade, é certo - ela morreria se tivesse ali um pássaro na gaiola! - mas dava a máxima importância a toda a informação que podia obter.
Ela não descansava se ele não chegava a casa e não se deitasse a seu lado. E esta parte do deitar lado a lado também era importante - mas não tanto. Porque o essencial é que ele voltasse para casa. Se quisesse dormir no chão ou no sofá e os preferisse à pele dela...não faria mal - porque havia sempre o amanhã, em que, por certo, tudo seria resolvido. O facto de ele se deitar a seu lado era o final feliz daquilo que já era, por si só, perfeito.
É que viviam no mesmo mundo. No mesmo mundo de paralelismos, confusões, sentimentos, impulsos. Só viverem ali os dois e partilharem toda aquela informação era, de facto, perfeito. Violento, assustador. Mas perfeito.
Ela precisava de o sabber ali para estar sossegada, precisava de o aconhegar para ter a noite completa. Ela precisava que ele precisasse. Ela necessitava da sinceridade dele como de pão para a boca. E a sinceridade dele toldava a felicidade dela. Porque, segundo parecia, a dependência era comum, ou melhor, era recíproca.
Ele precisava dela.
E isto...isto era perfeito.
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