domingo, janeiro 21, 2007

utopia II

Hoje escrevi uma carta.
Que há muito tempo não escrevo cartas assim.
Resolvi publicar:
«Há tanto não te escrevia!!
A verdade é que deixámosde ter tempo..ou será que é só uma desculpa? Sinceramente, não sei.
Sei que deixei de fazer muitas coisas que fazia, gostasse ou não. Correr, por exemplo. Escrever, escrever-te, dançar, fazer ballet, teatro, expressão plástica, desenhar, pintar, andar de bicicleta, passear à noite, almoçar com a minha avó, com as minhas amigas, torcer os dedos e pedir um desejo quando um jacto rasgava o céu...até deixei de escrever ao Tomás!!
Aprendi a largar-me das coisas e a viver com e sem elas. A poder desprender-me a qualquer momento, em qualquer altura. Tornar-me independente...não deixando de depender delas. Não sei se percebes.
Deixámos de ter tempo para tudo.
Agora estudamos, trabalhamos, comemos e (às vezes) dormimos. Mal falamos. Mal estamos. É isto existir? Quando voltaremos a brincar? Com os nossos putos? Aí é suposto deixá-los brincar...e nem sei se lá chego!
Quando voltaremos a pôr feijões no iogurte e salada na água? O guardanapo na sopa, onde foi?
Quando voltaremos a deixar-nos ir com uma música, esparramadas no chão, paradisiacamente sugadas para o fundo do mar de uma praia deserta, solarenga, palmeirosa, de água límpida...para acordarmos e gostarmos ainda mais da realidade?
Quando nos devolverão os nossos sábados?
Quando teremos tempo para viver absortas nos nossos pensamentos, nos nossos sonhos??Deixámos de ter tempo para nós.
De tal modo que nos esquecemos de quem fôramos, tal qual aos 10 anos nos impingissem um Mundo trabalhoso e mau, onde ou nos esfolamos e arrastamos à mercê de outrem para chegar a algum lado, ou nunca seremos nada digno de comida à mesa e cama lavada e nos gritem CRESCE! todos os dias. A imundície da sociedade de amanhã.
Já não somos nós.
Somos um poema, um resumo, uma capa sobre o Renascimento e uns apelidos do baú. Somos um monte de livros e algumas frases bem ditas.
No entanto, esperamos ansiso e subrepticiamente por fuzilar quem "servimos", queremos voltar a brincar num século que há-de chegar, e imaginamo-nos com um licenciamento a fazer algo que imaginámos (mas talvez não quiséssemos - porque não tínhamos tempo para querer) fazer.
Foi isto em que nos tornámos?
Quando?
Por alma de quem?
Será que gostamos de quem somos??
Ou não temos de gostar? Ou não podemos por não termos tempo?
Nunca nada vai mudar se não formos nós a provocá-lo; sabe-lo tão bem como eu. Às vezes era melhor se não soubéssemos, não tivéssemos aprendido, niguém no-lo tivesse mostrado...não tivéssemos crescido para o saber...não é?
Segundo a nossa amiga Diana,
"somos quem construimos"...
e citando alguém que amo tanto tavez também por nunca ter conhecido...
..."yo soy mi circunstancia"...mas tudo me parece utópico...»

2 comentários:

mac disse...

Yo soi yo y mi circunstancia.
Eu sou eu e a minha circunstância. Eu sou aquilo que sou mais o que o mundo à volta de mim é.
(Ou será que o mundo à volta de mim é aquilo que eu sou?...)

Mais ou menos isso.

mac disse...

E já agora, o amor mesmo mesmo é aquele pelas coisas que não conhecemos, ou que não conhecemos completamente, que apenas aceitamos porque amamos.
Quando passamos a sabê-las mesmo, já não pode haver novidade. Será que podemos continuar a maá-las?

Fico muito feliz por te saber a amar assim. E a amar esse alguém que não conheceste.